13.9.05

Continuu

Uma espécie de fixação por amor. Como as pessoas não duravam, o amor, apenas ele, persistia. E o personagem era projetado em cada sombra de identificação. Arrastada ao longo de amores, cada vez mais inalcançáveis.

E não é que não amasse. Era cada vez intenso. Mais autofágico também. Suicidava de amores em amores. Cultivando o velho hábito de enaltecer as qualidades de cada um, sobretudo, amar os defeitos.

Sabia amar cada vírgula. Conhecia o silêncio como ninguém. Enxergava a pureza em cada farpa do dia a dia. Entendia a natureza do próximo. Só não podia suportar a dor do amor sucumbir ao cotidiano. Este então lhe parecia a morte de sentido.

Tinha sido sim, muitas vezes, injusto com o possível. Tantas que perdera a conta... Não conseguia respirar o plausível, como se tivesse de salvar a si mesmo em cada estrada sem fim...

E tudo era amor demais. Ou falta de amor. Sem saber, não percebia que um não funcionava sem o outro. Não havia mesmo motivos para agir assim, de uma maneira ou de outra. Magoar alguém é que era o fim. Amava “de menos”, amava “de mais”, e lá estava: a incompreensão que parece mover o mundo. Como se a paz fosse o apocalipse...

Sem querer, ia arrastando paixões perfeitamente lunáticas, enquanto o bondoso amor-perfeito, assim, exagerado mesmo, carregado de obrigações, ia se tornando pesado; ele, pesaroso...

Muitos olhares antigos, entretanto, ofuscavam o pensamento. Ficava a dor de não poder continuar. Sim, correspondia sim. Amava todos os amores. E continuava amando, mesmo quem odiava sua intermitência existencial.

Quando alguém 'divorciava' então, vinha a culpa. O vinho que deveria ser mais saboroso, aos poucos, era efêmero. De um só gole, ele tomava suas certezas e parecia desistir na embriaguez-ápice. E quem queria ser 'certo', junto, chorava este furacão de busca contínuo...

Então ele derramava. Lágrimas daquele instante que nunca pode continuar sendo. Aquele, aquele, aquele que está por vir, o momento antes do orgasmo. Para ele, o resto persistia igual; a ressaca de todos os sentidos...

E se desculpava. Às vezes antes, durante, depois. Sabia no que não ia dar. Avisava. Sempre dizia. Mas o fato era que acreditava em pelo menos um momento. E porque acreditava neste momento, o momento, seria capaz de virar o mundo atrás dele. Se viesse mais rápido, mais rápido era o devaneio. Se custasse, mais instigante.

A arrogância era tanta, que nunca deixara de acreditar sem ter vivido. Nunca, nunca, nunca... Nunca não existe... Na verdade, uma vez o céu havia sido pouco pra sonhar. Sonhou, sonhou, até sorriu, guardou quimeras de instantes quase verdadeiros. Quase. Mas voltou. Literalmente. Azul? Passou a ser só blue... Uma saudade que, por si só já é intensa, pior quando poderia ter sido aquele, aquele momento...

E isso foi tão forte que até parou para pensar na continuidade de um agora mais calmo. Aceitando que não se pode pular de sonho em sonho, sugando alegrias e recordações-combustível. Nunca vivera este outro lado; quem fica com o não-vivido, não correspondido, como se não tivesse “sido” o suficiente. Talvez estivesse errado? Quem ia saber agora?

Mas não adiantava. Tentava, tentava. A estabilidade feliz, meta para muitos outros mortais, parecia um “expropriar” de tantos “eus” por vir... Um dia ia se esgotar. Talvez sim. Talvez não.

E ele chegou a querer. Ironias do destino, quase implorou. Bebeu da própria ausência e assistiu ao seu reflexo, no espelho de um outro alguém. Mas a palavra ainda não era 'agora'... Só restaram os cacos...

2 comentários:

Anônimo disse...

Simplesmente lindo! Me deixou com lágrimas nos olhos! Bjs.

Laura_Diz disse...

Que lindo! é isto mesmo, eu vivi isto anos a fio, sei o que diz.
Vou divulgar.
Valeu pelo niver. bj laura